quarta-feira, 6 de outubro de 2010

REISADO EM SÃO RAIMUNDO NONATO -PI DE MANOEL ANTÔNIO AOS DIAS ATUAIS

REISADO EM SÃO RAIMUNDO NONATO -PI DE MANOEL ANTÔNIO AOS DIAS ATUAIS
POR AGNALDO RIBEIRO DOS SANTOS

INTRODUÇÃO
O presente trabalho registra pesquisa sobre o reisado na cidade de São Raimundo Nonato-PI, de Manoel Antônio aos dias atuais. Fazendo uma reflexão sobre o texto de Pierre Nora. “Entre memória e História: a problemática dos Lugares”.
Aborda-se aqui como o reisado sobrevive até hoje e também as variações desse folguedo na cidade desde 1958.
BRINCADEIRA OU COISA SÉRIA
O Reisado, “brincadeira de caráter popular” como afirma Cineas Santos. O Reisado de Manoel Antônio. Projeto Petrônio Portella-1989. Era muito praticado na cidade e no interior. A referencia feita aqui ao Reisado de Manoel Antônio se dá pelo fato de ser um registro escrito sobre uma manifestação folclórica que aconteceu a quase 60 anos (1958). Não que no município não houve essa prática antes desta data. Pois conversando com pessoas idosas, pude constatar que as famílias tradicionais da cidade, no início do século passado, gostavam de fazer as festas de Reis com ajuda de pessoas simples, mas com a modernização e o urbanismo, as famílias influentes que festejavam os Santos Reis, não se interessaram mais no assunto. Algumas pessoas da periferia ainda tentaram manter essa tradição, como: Maria da Vanja que faleceu com 100 anos (2006), Dalha (já falecida) e Elvira Resadeira que tornou-se evangélica e não gosta de falar no assumo. Essas senhoras, principalmente Maria da Vanja, batia apenas na porta de quem poderia dar uma ajuda maior para sua festa de Reis, ou seja, os ricos. “Eu cantei muito Reis, há muito tempo atrás, mas eu não cantava na casa de pobre não, só cantava na casa dos ricos, pois eram quem tinham dinheiro para me dar para festa do dia 6 de janeiro. Agora na festa, vinha pobres e ricos, gente de todo lugar e era uma festa que o povo faltava não esquecer”. (Relato de Maria da Vanja, falado numa festa de 15 anos em 2004).
Já as outras Reiseiras citadas, atuaram na época de Manoel Antonio, mas desconheço qualquer registro escrito. Mas como diz Pierre Nora: “A passagem da memória para a história obrigou cada grupo redefinir sua identidade pela revitalização de sua própria historia.” Foi e é difícil a permanência dessa cultura, mas ainda há na cidade quem faça reisado restrito apenas a certas comunidades. Pouco divulgado, mas viva, embora em grupos específicos.
No povoado São Victor tem-se noticia de reisado muito antigo que era praticado lá e em outras comunidades da zona rural, vizinhas ao povoado. Atualmente, Isaias, São Vítor; Zé Pisa da comunidade calango; Dona Mercês, Boi Morto e outras pessoas ainda realizam esse Reisado na região.
Ao olhar do pesquisador, contenta-se saber que um grupo de pessoas do bairro primavera, revitalizaram esse Reisado do Povoado São Victor em janeiro de 2007 e, ao entrevistar Regina, responsável pelo evento, a surpresa em ouvir musicas como o canto de chegada e o lundu, cantados no mesmo ritmo, mas com variações e toadas diferentes. O Canto de chegada é o que se canta na frente da casa para o dono da residência abrir a porta é comum em todos os reisados que conheço em São Raimundo Nonato e região. Já o lundu, é cantado dentro da residência, típico do reisado religioso. Louva Santa Maria, São José, etc. Na conversa, descobriu-se várias músicas de batuque. O batuque é uma dança afro- indígena que era muito praticada na cidade até pouco mais da metade do século passado, mas não se sabe ainda o motivo, foi incorporado ao Reisado não só neste de origem do Povoado São Victor, mas em outros. Será que é “O arrancar do que ainda sobrou no calor tradição (...), na repetição do ancestral, sob o impulso de um sentimento histórico profundo”? (Pierre Nora, idem...).
Conversando com moradores do mesmo bairro descobriu-se que a maioria dos residentes ali, vieram da Fazenda São Vítor e trás o reisado nas veias, as vezes, é comum ver adultos cantando as músicas do reisado quando realizam sua tarefas diárias ou simplesmente para se divertir ou ninar crianças.
Outro reisado existente atualmente é o Reisado cigano da comunidade Novo Zabelê. Uma mistura de Termo das Pastorinhas com os dramas. A apresentação inicia com o canto de chegada, depois se apresentam adolescentes com fantasias de borboletas cantando a cor do seu figurino em versos. É um grupo de mulheres que entram fantasiadas de ciganas cantando e dançando batendo um pandeirinho na perna.
Neste tipo de reisado o mais emocionante é o momento em que as ciganas lêem as mãos de pessoas da platéia. Nenhuma certeza do passado ou previsão do futuro. As ciganas cantam versos agradando as pessoas que estão lendo a mão, sendo o ultimo verso cantado pedindo pagamento pelo serviço de cigana.
Este Reisado foi muito praticado na cidade com o titulo Termo das Pastorinhas e que recentemente foi apresentado por um grupo de senhoras em hotéis, festas comemorativas, buscando angariar fundos para uma instituição social.
“Tudo o que é chamado hoje de memória não é por tanto memória, mas já história”. Acho que nesse comentário escrito de Pierre Nora se adéqua bem ao Reisado que chamo hoje de Reisado das Figuras Lendárias, que teve inicio com Manoel Antonio, depois com o “Reisadinho” organizado principalmente por Cineas Santos, Paredão e Orlando da Bela (Cineas Santos, Reisado de Manoel Antonio). Mais tarde, um grupo de jovens do bairro gavião recriaram um reisado, mas não deram continuidade a ação.
Em 2002 o Grupo Teatro Culturart estreou o espetáculo Folia de Reis, comunicando nas linguagens artísticas: artes cênicas, visuais, musicais e artes da palavra, apresentado por 22 pessoas entre atores, atrizes e músicos, entre crianças, jovens e adultos, numa faixa etária entre 5 e 58 anos.
O espetáculo encanta pelo sincretismo cultural existente como lendas, mitos, cordel e religião (católica espiritismo, etc).
Esse foi um trabalho de pesquisa que primeiro foi inspirado no Reisado do Povoado São Victor, a partir de entrevistas com a senhora Hilda Ferreira dos Santos, no Grupo apresentava o canto de chegada e o lundu, revivendo o reisado religioso da zona rural. No ano seguinte (2003) o “Folia Reis” sofre alterações, desta vez baseado no Reisado de Manoel Antonio, não se trata aqui da recriação deste reisado, mas uma forma de perpetuação do folguedo na cidade. Estreando as personagens: Puxador, caretas, reiseiras, boi, burrinha e lobisomem. Daí em diante, a cada ano, é incorporado novo personagem, no folguedo, Jaraguá, urubu, guabiraba, caipora e pai de santo.
Este espetáculo é apresentado tradicionalmente de 02 a 05 do mês de janeiro nas residências e dia 06 do mesmo mês na Festa de Reis. Nos outros meses do ano o folguedo e visto em Feiras, Festivais, escolas, bares e instituições da microrregião.
O Projeto Folia de Reis revitaliza a cultura material e imaterial, preservando a manifestação tradicional do reisado, embora com adaptações. O projeto ainda realiza aulas e oficinas de teatro e música para crianças e adolescentes e cursos na área artística (Projeto Folia de Reis Grupo Culturart, 2006).
O Grupo Culturart, mobiliza-se buscando condições de sustentabilidade, firmando parceria com empresas, pessoas físicas e instituições culturais e sociais, apoio que permitiu a realização de cursos de artesanato e escultura, facilitando a confecção de alguns personagens do Folia de Reis (boi, burrinha, etc).
De julho de 2005 a janeiro de 2006, teve o projeto Folia de Reis aprovado no programa BNB de cultura do Banco do Nordeste para a compra de figurino. O que veio enriquecer ainda mais o espetáculo e elevar a alto-estima dos participantes.
A grande dificuldade encontrada era a falta de uma sede própria para o Culturart, mas não caracterizava um obstáculo para impedir a realização do folguedo, que na maioria das vezes foi ensaiado e apresentado na rua. As reuniões, aulas e oficinas foram realizadas na casa do presidente do grupo. Hoje com uma sede própria, as atividades são realizadas com freqüência criando um vinculo dos participantes do reisado e população local com o folguedo.
O Espetáculo Folia de Reis nasceu na comunidade e mesmo organizado pelo Culturart, todas as pessoas interessadas em participar, ingressavam no espetáculo, que nesta época totalizar mais de 30 integrantes. Com o passar do tempo, o espetáculo tomou formas artísticas, exigindo mais dos atores e muitas pessoas saíram, ou por motivos pessoais, ou por não se empenhar mais nos objetivo do Projeto: “Proporcionar lazer à sociedade, resgatando ideais sócios culturais, incentivando o folclore e mostrando a arte como meio de inclusão social, além de contribuir para a formação intelectual de crianças, adolescentes e jovens” (Grupo Culturart, 2003).
A cultura pode ressurgir a cada dia através da pesquisa e de iniciativas desenvolvidas nas escolas, mas para isso o apoio é fundamental tanto financeiramente como teoricamente.
Se a história é cultura e vice-versa, desenvolvendo uma atividade cultural, faz-se historia. No caso do reisado é preciso mais incentivo aos grupos que realizam esse folguedo, para preservar nosso folclore.
CONCLUSÃO
Para a própria existência da cultura, é preciso registro e um trabalho educativo que incentive apresentações culturais nas escolas e em eventos culturais e artisticos.
Com este fundamento realizou-se pesquisa sobre o reisado na cidade, criando documentos que servirá para professores, alunos e pesquisadores aprofundarem seus conhecimentos sobre o assunto.
REFERENCIAS
SANTOS, Cineas. O reisado do Manoel Antonio, Teresina. Projeto Petronio Portela. 1987.
Projeto Folia de Reis. Grupo Culturart. 2005.
NORA, Pierre. Entre Memória e Historia, São Paulo nº 10, 1981

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